sábado, 16 de outubro de 2010

Noite de Sonhos voadas



Noite de sonhos voada 
cingida por músculos de aço, 
profunda distância rouca 
da palavra estrangulada 
pela boca armodaçada 
noutra boca, 
ondas do ondear revolto 
das ondas do corpo dela 
tão dominado e tão solto 
tão vencedor, tão vencido 
e tão rebelde ao breve espaço 
consentido 
nesta angústia renovada 
de encerrar 
fechar 
esmagar 
o reluzir de uma estrela 
num abraço 
e a ternura deslumbrada 
a doce, funda alegria 
noite de sonhos voada 
que pelos seus olhos sorria 
ao romper de madrugada: 
— Ó meu amor, já é dia!... 

Manuel da Fonseca

Sentimentos

Sentimentos são como tintas!

Fundem-se na paleta do coração!
Diluídos e adicionados por pinceis
fabricados de pensamentos,
transfiguram e desenham nos olhos,
o gosto salgado que às vezes acalma!
São cores frias e quentes que modificam
no nosso infinito,
a aparência da alma!
http://twitter.com/RLi5boa
Publicado no Recanto das Letras em 11/07/2005

Um carinho...

Há palavras que nos beijam



Há palavras que nos beijam 
Como se tivessem boca. 
Palavras de amor, de esperança, 
De imenso amor, de esperançar louca. 

Palavras nuas que beijas 
Quando a noite perde o rosto; 
Palavras que se recusam 
Aos muros do teu desgosto. 

De repente coloridas 
Entre palavras sem cor, 
Esperadas inesperadas 
Como a poesia ou o amor. 

(O nome de quem se ama 
Letra a letra revelado 
No mármore distraído 
No papel abandonado) 

Palavras que nos transportam 
Aonde a noite é mais forte, 
Ao silêncio dos amantes 
Abraçados contra a morte. 

Alexandre O'Neill

Janela do Sonho

Abri as janelas 
que havia dentro de ti 
e entrei abandonado 
nos teus braços generosos. 

Senti dentro de mim 
o tempo a criar silêncio 
para te beber altiva e plena. 

Mil vezes 
repeti teu nome, 
mil vezes, 
de forma aveludada 
e era a chave 
que se expunha 
e fecundava dentro de mim. 

Já não se sonha, 
deixei de sonhar, 
o sonho é poeira dos tempos 
é a voz da extensão 
é a voz da pureza 
que dardejava na nossa doçura. 

Quando abri as tuas janelas 
e despi teus braços 
perdi a vaidade 
e a pressa, 
amei a partida 
e em silêncio abri, 
(sem saber que abria) 
uma noite húmida 
em combustão secreta 
desmaiado no teu ombro 
de afrodite. 

Carlos Melo Santos

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Nunca, por mais

Nunca, por mais que viaje, por mais que conheça 
O sair de um lugar, o chegar a um lugar, conhecido ou desconhecido, 
Perco, ao partir, ao chegar, e na linha móbil que os une, 
A sensação de arrepio, o medo do novo, a náusea — 
Aquela náusea que é o sentimento que sabe que o corpo tem a alma, 
Trinta dias de viagem, três dias de viagem, três horas de viagem — 
Sempre a opressão se infiltra no fundo do meu coração. 

Álvaro de Campos

O céu e o Ninho





És ao mesmo tempo o céu e o ninho. 

Meu belo amigo, aqui no ninho, 
o teu amor prende a alma 
com mil cores, 
cores e músicas. 

Chega a manhã, 
trazendo na mão a cesta de oiro, 
com a grinalda da formosura, 
para coroar a terra em silêncio! 

Chega a noite pelas veredas não andadas 
dos prados solitários, 
já abandonados pelos rebanhos! 
Traz, na sua bilha de oiro, 
a fresca bebida da paz, 
recolhida 
no mar ocidental do descanso. 

Mas onde o céu infinito se abre, 
para que a alma possa voar, 
reina a branca claridade imaculada. 
Ali não há dia nem noite, 
nem forma, nem cor, 
nem sequer nunca, nunca, 
uma palavra! 

Viagem


PELOS POROS,
INEVITAVELMENTE,
VAZA A VIDA,
NO MESMO INSTANTE
O SONHO VAGA,
IRREVERSIVELMENTE
PELA ALMA
DELIRANTE
PENETRADA POR UM OLHAR CÓSMICO E NÍTIDO.
PELOS POROS,
SUBITAMENTE, ASSISTIMOS CASA MIRAGEM.
SILÊNCIOS SEM GESTOS E NOVAMENTE, SONHOS EM ÊXTASE
DESABANDO CADA IMAGEM ENCERRANDO A VIDA NUN CANTO
E PONTOS FINAIS
MARCAM O INÍCIO.

Nova Primavera que o outono preparou...