sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Acordar de hoje...

Corpo ainda implora por tempo, quieto, inerte ali jogado, aninhado, acomodado na cama. Olhos insistem em permanecerem fechados mas o despertador não cansa... me chama... me chama... me grita. Diz: abra os olhos, mova-se,  erga este corpo vem até mim, ele me provoca...
Pergunto-me por quê?
Inconsciente  do presente preparado à minha espera...
Devagar sento-me, corpo preguiçoso , olhos entreabertos, seguro o despertador ainda questionando a realidade e o faço “calar”.
As cortinas se movem chamando minha atenção, levanto os olhos a procura do movimento e por entre as frestas estreitas do balançar  vejo o sorriso do dia numa matizes de cores vinda da nascente onde o sol brincava com as cores indescritíveis do amanhecer.
Observei ... com meio sorriso de sono e alegria, agradeci a Deus pelo presente.
Cuidadosamente toquei o despertador, com pensamento de gratidão repeti  o movimento preparando-o para o amanhã.
Espreguicei diante da cena... fresta, sol e cama. Ergui com respiração renovada...6:10... a água gelada na pele faz o trabalho restante do despertar para de coração aberto começar este lindo novo dia... bom dia, dia. Bom dia Mundo. 

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

A cor da Tua Alma



Enquanto eu te beijo, o seu rumor 
nos dá a árvore, que se agita ao sol de ouro 
que o sol lhe dá ao fugir, fugaz tesouro 
da árvore que é a árvore de meu amor.    

Não é fulgor, não é ardor, não é primor 
o que me dá de ti o que te adoro, 
com a luz que se afasta; é o ouro, o ouro, 
é o ouro feito sombra: a tua cor. 

A cor de tua alma; pois teus olhos 
vão-se tornando nela, e à medida 
que o sol troca por seus rubros seus ouros, 
e tu te fazes pálida e fundida, 
sai o ouro feito tu de teus dois olhos 
que me são paz, fé, sol: a minha vida! 

Juan Ramón Jiménez

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Procuro-te



Procuro a ternura súbita, 
os olhos ou o sol por nascer 
do tamanho do mundo, 
o sangue que nenhuma espada viu, 
o ar onde a respiração é doce, 
um pássaro no bosque 
com a forma de um grito de alegria. 

Oh, a carícia da terra, 
a juventude suspensa, 
a fugidia voz da água entre o azul 
do prado e de um corpo estendido. 

Procuro-te: fruto ou nuvem ou música. 
Chamo por ti, e o teu nome ilumina 
as coisas mais simples: 
o pão e a água, 
a cama e a mesa, 
os pequenos e dóceis animais, 
onde também quero que chegue 
o meu canto e a manhã de maio. 

Um pássaro e um navio são a mesma coisa 
quando te procuro de rosto cravado na luz. 
Eu sei que há diferenças, 
mas não quando se ama, 
não quando apertamos contra o peito 
uma flor ávida de orvalho. 

Ter só dedos e dentes é muito triste: 
dedos para amortalhar crianças, 
dentes para roer a solidão, 
enquanto o verão pinta de azul o céu 
e o mar é devassado pelas estrelas. 

Porém eu procuro-te. 
Antes que a morte se aproxime, procuro-te. 
Nas ruas, nos barcos, na cama, 
com amor, com ódio, ao sol, à chuva, 
de noite, de dia, triste, alegre — procuro-te. 

Eugénio de Andrade

Que farei no outono quando tudo arde


Que farei no outono quando ardem 
as aves e as folhas e se chove 
é sobre o corpo descoberto que arde 
a água do outono 

Que faremos do corpo e da vontade 
de o submeter ao fogo do outono 
quando o corpo se queima e quando o sono 
sob o rumor da chuva se desfaz 

Tudo desaparece sob o fogo 
tudo se queima tudo prende a sua 
secura ao fogo e cada corpo vai-se 

prendendo ao fogo raso 
pois só pode 
arder imerso quando tudo arde.

Gastão Cruz

domingo, 17 de outubro de 2010

Os meus pensamentos são todos sensações



Sou um guardador de rebanhos. 
O rebanho é os meus pensamentos 
E os meus pensamentos são todos sensações. 
Penso com os olhos e com os ouvidos 
E com as mãos e os pés 
E com o nariz e a boca. 
Pensar uma flor é vê-la e cheirá-la 
E comer um fruto é saber-lhe o sentido. 
Por isso quando num dia de calor 
Me sinto triste de gozá-lo tanto. 
E me deito ao comprido na erva, 
E fecho os olhos quentes, 
Sinto todo o meu corpo deitado na realidade, 
Sei a verdade e sou feliz. 

Alberto Caeiro

Refletindo...