quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Dor...


Dor de saudade
Dor que esmaga
E faz querer  útero
Que aninha pedindo colo.

Dor que não tem jeito
Feita para sentir
Dos que permitiram amar
Sendo amados e perderam

A causa de fugir
Buscar alento nos pedaços deixados
No coração que derrama
Na lágrima cristalizada
No pulmão aberto,
Alma que chora.

Amor, dor, perda
Será perda ou ganho?
Perdi e ganhei
Perdi colo...
Ganhei eternidade
Em forma de saudade, não há como esquecer...

As formas permanentes da dor
Na flor regada que brotou
No abraço apertado
Sorriso estampado
Na benção de cada dia

Dor adquirida, carregada, sentida.
E quando além do meu Ser sinto o tocar de seus braços...
Abraça-me Mãe...

E no desvelo de suas mãos posso adormecer novamente
Certa do amor que toda filha desejou ter.
Minha eterna flor primeira
És minha flor, flor mundo, flor tudo... Mãe flor...
Lágrimas de amor...

Dois anos sem você...

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Inocência

Vou aqui como um anjo, e carregado 
De crimes! 
Com asas de poeta voa-se no céu... 
De tudo me redimes, 
Penitência 
De ser artista! 
Nada sei, 
Nada valho, 
Nada faço, 
E abre-se em mim a força deste abraço 
Que abarca o mundo! 

Tudo amo, admiro e compreendo. 
Sou como um sol fecundo 
Que adoça e doura, tendo 
Calor apenas. 
Puro, 
Divino 
E humano como os outros meus irmãos, 
Caminho nesta ingénua confiança 
De criança 
Que faz milagres a bater as mãos. 

Miguel Torga

Mãe

Mãe: 
Que desgraça na vida aconteceu, 
Que ficaste insensível e gelada? 
Que todo o teu perfil se endureceu 
Numa linha severa e desenhada? 

Como as estátuas, que são gente nossa 
Cansada de palavras e ternura, 
Assim tu me pareces no teu leito. 
Presença cinzelada em pedra dura, 
Que não tem coração dentro do peito. 

Chamo aos gritos por ti — não me respondes. 
Beijo-te as mãos e o rosto — sinto frio. 
Ou és outra, ou me enganas, ou te escondes 
Por detrás do terror deste vazio. 

Mãe: 
Abre os olhos ao menos, diz que sim! 
Diz que me vês ainda, que me queres. 
Que és a eterna mulher entre as mulheres. 
Que nem a morte te afastou de mim! 

Miguel Torga