"A morte não é o fim de tudo.
Ela não é senão o fim de uma coisa
e o começo de outra.
Na morte o homem acaba,
e a alma começa.
Que digam esses que atravessam a hora fúnebre,
a última alegria, a primeira do luto.
Digam se não é verdade que ainda há ali alguém,
e que não acabou tudo?
Eu sou uma alma.
Bem sinto que o que darei ao túmulo
não é o meu eu, o meu ser.
O que constitui o meu eu, irá além.
O homem é um prisioneiro.
O prisioneiro escala penosamente
os muros da sua masmorra.
Coloca o pé em todas as saliências
e sobe até ao respiradouro.
Aí, olha, distingue ao longe a campina.
Aspira o ar livre, vê a luz.
Assim é o homem.
O prisioneiro não duvida que encontrará
a claridade do dia, a liberdade.
Como pode o homem duvidar se vai encontrar a eternidade à sua saída?
Por que não possuirá ele um corpo sutil, etéreo
De que o nosso corpo humano não pode ser senão um esboço grosseiro?
A alma tem sede do absoluto e o absoluto não é deste mundo.
É por demais pesado para esta terra.
O mundo luminoso é o mundo invisível.
O mundo do luminoso é o que não vemos.
Os nossos olhos carnais só vêem a noite.
A morte é uma mudança de vestimenta.
A alma, que estava vestida de sombra,
vai ser vestida de luz.
Na morte o homem fica sendo imortal.
A vida é o poder que tem o corpo de manter
a alma sobre a terra, pelo peso que faz nela.
A morte é uma continuação.
Para além das sombras,
estende-se o brilho da eternidade.
As almas passam de uma esfera para outra,
tornam-se cada vez mais luz.
Aproximam-se cada vez mais e mais de Deus.
O ponto de reunião é no infinito.
Aquele que dorme e desperta, desperta e vê que é homem.
Aquele que é vivo e morre, desperta e vê que é Espírito”.
(Victor Hugo)
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O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto.
Fernando Pessoa
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